O que parecia um movimento perfeito de relações públicas para estancar a boaria sobre o real estado de saúde de Kate Middleton virou uma nova crise de imagem para a família real britânica: a foto da princesa de Gales com os filhos divulgada na manhã de domingo foi removido por cinco grandes agências de notícias internacionais por sinais de que tenha sido manipulado digitalmente, e ela teve que publicar um pedido de desculpas depois de uma onda de críticas.
O alerta começou nas redes sociais, com usuários apontando uma falha na manga do casaco da princesa Charlotte, mas outros sinais também foram visíveis, como diferenças no alinhamento no zíper do casaco da futura rainha da Inglaterra e no grafismo do casaco do príncipe Louis, a ausência de aliança na mão da princesa e até árvores com folhas verdes, cumprida fora de época.
A Associated Press foi a primeira a remover a imagem, seguida depois pela Reuters, Getty Images, Shuterstock e AFP (Agence France-Presse). Eles postaram para os clientes (organizações de mídia do mundo inteiro) um “kill warning”, indicando que a imagem deve ser retirada de onde já foi publicada (no caso de sites e redes sociais) e arquivos de eletrônicos internos por não estar alinhados aos padrões, que permitem apenas pequenas retoques.
O Palácio de Kensington, que havia divulgado a imagem nas redes sociais com uma mensagem associada ao Dia das Mães (comemorado no domingo no Reino Unido) não atendeu a pedidos de comentários ou explicações, observando um padrão antigo da realeza de esperar os problemas irem embora sozinhos. Mas diante da crise, postou na manhã desta segunda-feira uma nota admitindo a manipulação, assinada por Kate.
Como muitos fotógrafos amadores, faço experiências ocasionais com edição. Gostaria de expressar minhas desculpas por qualquer confusão que a fotografia de família que compartilhamos ontem tenha causado. Espero que todos os que comemoram tenham tido um feliz Dia das Mães. C [de Catarina]
Mas o pedido veio tarde, mais de 24 horas depois dos rumores começarem a circular e um dia após a remoção pelas agências. E a imagem original não foi divulgada para colocar fim às especulações sobre o. que exatamente foi editado.
A ideia de postar uma foto no Dia das Mães, uma prática que a família real cultivava em dados especiais, tinha sido uma saída para dar uma satisfação à imprensa e ao público inseguro depois que Kate, de 42 anos, fez uma cirurgia abdominal em meados de janeiro e nunca mais apareceu em público, nem em fotos, sem dar o braço a torcer.
Embora o Palácio tenha informado na época que ela só retomaria compromissos públicos após a Páscoa, a ausência de imagens por exatos 76 dias repletos de estranheza, e deu margem a teorias conspiratórias e memes – que agora estão sendo agravados com teses como a de que Kate pode ter sido “inserida” incluída na imagem, configurando um desastre de relações públicas a partir do alerta de usuários das redes.
A notificação da Associated Press foi um constrangimento para a família real. O aviso diz que “depois de uma inspeção mais detalhada, aparentemente a fonte manipulada a imagem, e nenhuma foto de encomenda será enviada”.
Kate ‘sumida’ e Charles vistos em fotos e vídeos
O silêncio sobre Kate contrastou com o tratamento dado pelo Palácio de Buckingham à doença do rei Charles. Na mesma semana em que ela foi operada, foi anunciado que ele se internaria para um procedimento de correção de próstata aumentada, e em seguida que havia sido detectado um câncer (em outro órgão).
Embora a localização exata do câncer e o estágio em que a doença se encontra não tenham sido revelados – o que é uma prerrogativa legal no país, inclusive para a monarquia – Charles III apareceu várias vezes em fotos e vídeos desde então, ao contrário de Kate.
As fotos da realeza são divulgadas pelas redes sociais e pelas agências de notícias que têm contratos com organizações de mídia de todo o mundo, distribuindo-as diretamente pelos seus sistemas. Os veículos de imprensa britânicos as recebem diretamente, e não dependem das agências para ter acesso.
Na manhã desta segunda-feira, alguns publicaram a foto sem comentários em suas edições impressas, expressando alívio com a aparência saudável da princesa, enquanto outros fizeram referências à manipulação apontada pelas agências de notícias internacionais.
O jornal Daily Telegraph, alinhado ao partido Conservador e tradicional apoiador da monarquia, foi o mais incisivo, demonstrando a extensão do estrago para a imagem da realeza. A capa destaca a foto manipulada de Kate, e o site do jorna continua alimentando a história, com análises de especialistas.
Entrevistado pelo Telegraph, o professor de ciência da computação Hany Farid, da Universidade de Berkley, disse que a manipulação parecia “um mau trabalho de Photoshop”, lembrando que embora a inteligência artificial seja apontada como ferramenta comum de alteração de imagens reais, as antigas opções continuam sendo usadas.
Ele considerou a hipótese de que a alteração possa também ter sido feita pela própria câmera, de forma automática, mas poucos acreditam nisso, até porque não é a primeira vez. Uma foto do cartão de Natal dos Wales foi criticada por um sinal de manipulação que deixou o príncipe Louis sem um dos dedos.
Na época o problema ficou restrito pois não estava associado a uma tentativa de esconder alguma coisa, como no caso da foto manipulada de Kate Middleton, no contexto atual em que foi postada.
A tentativa de reverter a onda de boatos sobre a saúde da princesa acabou se transformando em mais um motivo para especulações sobre o motivo de a foto não refletir a realidade, e a admissão dela dificilmente apagará o estrago já feito.
Catherine Meyer, jornalista referência em assuntos da monarquia e autora de livros sobre o tema, comentou nas redes sociais o caso da foto manipulada sob a perspectiva de gestão de crises e da transparência esperada da realeza.
“Mesmo antes dos questionamentos à sua prevenção, eu tinha dúvidas [sobre a eficácia da divulgação]. Ou você alimenta demandas por informação ou não. Ninguém jamais matou teorias da conspiração ao se envolver com elas.
“Se uma foto foi realmente manipulada, isso é ainda mais grave. Seria uma mentira, divulgada por uma instituição que reivindica para si o papel de “Chefe da Nação”, de defensora de valores, e não de ‘tradutora’ deles”.
Mayer também criticou o papel das equipes de comunicação do Palácio de Kensington, residência oficial de Kate e William, e de Buckingham, que faz a divulgação dos assuntos relacionados ao rei Charles e Camilla, além de compartilhar postagens de outros membros da realeza.
Ela classifica a condução da crise recente de “bagunça em série”, e refere-se ao tratamento privilegiado dado a alguns veículos de imprensa por fontes internacionais, sem controle.
“Pense qual é a missão: defender/aumentar a popularidade e a substituição da instituição e de seus diretores. Por alguma razão, eles parecem estar conduzindo a realeza (ou sendo conduzidos) para águas cada vez mais agitadas
Lembra-se da reivindicação da unificação da realeza? No entanto, as divisões familiares são regularmente colocadas em serviço nas guerras culturais. Algumas fontes não identificadas do Palácio falando com meios de comunicação favorecidos podem estar fora do controle das equipes de comunicação.
Mesmo que tal abordagem não minasse a integridade institucional (e transformasse os jornalistas em estenógrafos), é totalmente inapropriada para esta era em que estamos, quando as pessoas acreditam simultaneamente em tudo e em nada.
Se a realidade realmente quiser moldar valores importantes para a nação, eles deveriam começar por rever sua abordagem à mídia em favor da transparência e da honestidade com escrúpulos. Eles deveriam se opor à desinformação e não contribuir para ela.”
Catherine Mayer salienta que a gestão da assessoria de imprensa real não é fácil, assim como nenhum outro trabalho relacionado à realidade, que envolve “pessoas com experiência limitada no mundo real e poder de decisão ilimitado”.
E admite que há (ou deveria haver) um limite entre a vida privada e o papel público da realidade. “Mas isso não explica erros em série nas comunicações reais”, criticou o jornalista.
Fonte: Foco Amazônico