O Carnaval de 2019 ainda está em pleno curso mas já se sabe que passará à história como a celebração da repulsa do povo brasileiro ao governo de Jair Bolsonaro e do desejo de ver Lula Livre. Na madrugada desta terça (5), a partir de 1h35, a Paraíso do Tuiuti entrará na Marquês de Sapucaí com o enredo “O Salvador da Pátria”. Trata-se de uma homenagem ao ex-presidente, com paralelismo com sua história de vida -nos tempos obscuros de um regime neofascista, os compositores da escola foram prudentes e não mencionaram o nome de Lula.
A Tuiuti foi vice-campeã no desfile de 2018, com o enredo “Meu Deus, Meu Deus! Está extinta a escravidão?” que denunciou o racismo no país e fez uma crítica mordaz ao golpe contra Dilma. No desfile, um destaque da escola, o professor de história Leonardo Morais, de 40 anos, apresentou-se como “vampirão neoliberalista”, com uma fantasia com terno, faixa presidencial e uma
O carnavalesco da escola, Jack Vasconcelos, antecipou assim o que o Brasil verá e escutará nesta madrugada: “Vocês que fazem parte dessa massa irão conhecer um mito de verdade: nordestino, barbudo, baixinho, de origem pobre, amado pelos humildes e por intelectuais, incomodou a elite e foi condenado a virar símbolo da identidade de um povo. Um herói da resistência!”.
A letra tem trechos todos inspirados por dois momentos marcantes da vida de Lula, sua jornada de retirante e sua eleição à Presidência como expressão da vitória do povo sobre os “dotô” (as elites):
Do nada um bode vindo lá do interior
Destino pobre, nordestino sonhador
Vazou da fome, retirante ao Deus dará
Soprou as chamas do dragão do mar
(…)
Ora meu patrão!
Vida de gado desse povo tão marcado
Não precisa de dotô
Quando clareou o resultado
Tava o bode ali sentado
Aclamado o vencedor
O bode ao qual se refere a letra é o bode Ioiô, personagem real das ruas de Fortaleza, onde chegou pelas mãos de um retirante que fugia de uma grande seca no interior cearense, em 1915. Carismático e popular, Ioiô perambulava pelas ruas da capital. Fazia diariamente o mesmo trajeto, da Praia do Peixe (hoje Praia de Iracema) à Praça do Ferreira; ao cair da tarde, voltava pelo mesmo caminho — daí o nome Ioiô. Fez muitos amigos, entre eles poetas e intelectuais, com os quais levava uma vida boêmia regada a muitas doses de cachaça. No auge da fama, Ioiô foi eleito para a Câmara de Vereadores, em 1922 — tempo em que as cédulas eram pedaços de papel escritos à mão –, mas levou um “golpe” da elite fortalezense e teve sua eleição impugnada. É no paralelismo entre o bode e Lula que está a marcada poética dos compositores láudio Russo, Moacyr Luz, Dona Zezé, Jurandir e Aníbal.