Além dos quase 20 trabalhadores mortos, sindicatos apontam mais de 40 contaminados pelo novo coronavírus.
Empresas que paralisaram, estão retornando das férias coletivas às atividades de produção | Foto: Arquivo Em Tempo
Desde a segunda semana deste mês, pelo menos 23 empresas do Polo Industrial de Manaus (PIM) têm retornado às atividades produtivas, integral ou parcialmente. Outras sequer paralisaram em meio à aceleração descontrolada da pandemia do novo coronavírus (Covid-19), segundo pesquisa do Centro da Indústria do Estado do Amazonas (Cieam). Enquanto isso, representantes dos trabalhadores do PIM, afirmam que há dezenas de casos de contaminação e de vítimas do vírus.
O Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias de Plástico (Sindplast) afirmou que dentro do setor há pelo menos 40 casos de trabalhadores contaminados pela Covid-19 e pelo menos quatro mortos. Já o Sindicato dos Trabalhadores Metalúrgicos do Amazonas (Sindmetal-AM), informou que a entidade tem 15 notificações de trabalhadores dos setores que representa, vítimas do novo coronavírus.
O presidente do Sindmetal, Valdemir Santana, observou que o número pode ser maior, já que o registrado é apenas dos sindicalizados que entraram em contato com o Sindmetal, quando ficaram doentes. “O sindicato está se colocando na mesma posição que a Organização Mundial da Saúde (OMS), ou seja, que aglomerações vão gerar mais caos de trabalhadores infectados e consequentemente mais mortes”, comentou o presidente do Sindmetal, Valdemir Santana.
Notas de pesar já estão nas galerias de perfis no Facebook dos sindicatos. Uma publicação no Sindmetal lamenta a morte de um funcionário do setor de eletrônicos do Distrito Industrial de Manaus. Nos comentários da postagem, outros trabalhadores se queixam do medo de retornar às atividades durante a pandemia.
“Como ficam os familiares dos colegas que trabalhavam com ele [?]. Todos em risco. Estou usando esse caso como exemplo, mas todos nós corremos risco. Ficamos em casa, mas todo dia alguém da família sai para trabalhar, vai e vem de rota, refeitório e linha de produção. Se o comércio pode fechar e ter prejuízo, por que as fábricas não podem?” Questiona o perfil.
Familiares morreram
Um trabalhador de 45 anos do setor de duas rodas, que preferiu não se identificar, conta que ele sentiu sintomas da Covid-19 ainda no final de março. Sem achar que fosse o novo coronavírus, mesmo porque não estava em situação grave, ele continuou a trabalhar. “Achei que fosse um resfriado porque eu estava apenas com coriza e tosse. Mas, depois de alguns dias veio a falta de ar. Eu fui afastado temporariamente da empresa para me cuidar e eles me deram apoio médico”, conta o profissional.
Apesar da atenção da empresa nesse momento, já era tarde para o trabalhador. Ele sobreviveu, mas a mãe idosa manifestou os sintomas no mesmo período, de forma muito mais intensa. Segundo ele, foram nove dias para ela vir a falecer no dia 6 de abril. A morte da idosa foi registrada como ‘síndrome respiratória aguda grave’, mas no dia 9 de abril saiu o resultado positivo para Covid-19, o que leva a fonte a crer que ele também estava infectado e muito provavelmente foi ele que transmitiu o vírus para mãe.
“Não posso dizer que peguei [a Covid-19] na empresa, mas eu ainda trabalhei lá alguns dias antes deles me liberarem e provavelmente alguém tenha contraído também”, afirmou o funcionário de empresa do PIM, que ainda segue afastado do trabalho após o resultado positivo da mãe.
Queixas dos trabalhadores
O presidente do Sindplast, Francisco Brito, observou que as organizações médicas tem avisado que quanto mais aglomeração, maior a contaminação. “O próprio governo do Estado já anunciou que o pico da pandemia deve seguir até a segunda semana de maio. Temos a opinião que o Distrito deveria parar até reduzir o pico da doença, porque se isso não acontecer, vai ser um genocídio no Distrito Industrial”, comenta o presidente.
Brito disse ainda que trabalhadores têm se queixado das medidas de distanciamento social e uso de equipamentos de proteção individual. “Eles falam de aglomerações que ainda existem nas empresas. Citam os refeitórios, onde dizem que as pessoas costumam retirar as máscaras para que possam levar a refeição até a boca. Isso de tirar os EPIs também acontece no transporte de rota e nos banheiros das empresas”, comentou o sindicalista.
Retorno das atividades
Mesmo diante dos números de contaminados em Manaus, que se aproximam de 3 mil, sem contar os subnotificados, o vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado do Amazonas (Fieam), Nelson Azevedo, defendeu que as empresas que adiantaram as férias coletivas, como medida de retenção do vírus, retornem com as atividades produtivas. Observou apenas que elas devem cumprir as medidas de segurança defendidas pelas autoridade da saúde.
Segundo Nelson, aquelas que retornaram com a produção têm adotado cuidados, como medição de temperatura, distância social e uso de equipamentos de proteção individual. “Algumas empresas já retornaram e outras estão fazendo agora, entre 4 e 10 de maio. Logicamente que se nós formos esperar passar essa pandemia, fica uma situação muito delicada para as empresas, trabalhadores e governo, que deixa de arrecadar. Não podemos manter essas medidas, acho que tem que liberar o comércio, haver um controle”, comenta Nelson.
Empresas a todo vapor durante o pico da pandemia
A pesquisa do Cieam, mencionada no início desta matéria, apresentou ainda outros dados do retorno das atividades das empresas do Distrito. Segundo as companhias entrevistadas, das 23, apenas oito pararam 100%. As outras tiveram alteração parcial da produção. Seis delas paralisaram de 50 a 75%; cinco interromperam de 25% a 50%; uma informou que houve paralisação de 25%; e três continuaram normalmente.
Outro ponto frisado pelas companhias é que todas pretendem retomar as atividades, total ou parcialmente, entre este mês de abril e o mês de maio. O grande problema é que a data de volta dos trabalhos é exatamente a mencionada pela Fundação de Vigilância em Saúde (FVS-AM) para quando haverá explosão de casos de coronavírus no Amazonas.
No início deste mês, o Ministério da Saúde também publicou uma pesquisa que prevê o pico de casos de coronavírus para abril e maio, no Amazonas. O texto foi publicado na Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical.
Com informações: EMTEMPO